dezembro 13, 2006

Todas as vidas




Vive dentro de mim uma
cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada
ao pé do borralho,
olhando para o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço...
Ogum. Orixá.
Macumba,
terreiro.
Ogã, pai-de-santo...
Vive dentro de mim
a lavadeira
do Rio Vermelho.
Seu cheiro gostoso
d'água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.S
uma coroa verde
de São-caetano.

Vive dentro de mim

a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.

Vive dentro de mim

a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada,
sem preconceitos,
de casca-grossa,
de chinelinha,
e filharada.

Vive dentro de mim

a mulher roceira.
-Enxerto de terra,
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos,
Seus vinte netos.

Vive dentro de mim

a mulher da vida.
Minha
irmãzinha...
tão desprezada, t
ão murmurada...
Fingindo ser alegre
seu triste fado.
Todas as vidas
dentro de mim:
Na minha vida
- a vida mera das obscuras!

Cora Coralina


Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, imortalizada por seu pseudônimo, Cora Coralina (Vila Boa de Goiás, 20 de Agosto de 1889 - Goiânia, 10 de Abril de 1985), poetisa brasileira.

Mulher simples, doceira de profissão, tendo vivido longe dos grandes centros urbanos, alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos do cotidiano do interior brasileiro, em particular dos becos e ruas históricas de

Goiás.

Fonte: Wikipedia

Mais aqui

ui ui ui

Fazer tchbum

Postar um comentário